18.7.10

DEFRONTANDO O FANATISMO

Quando voltei a Portland, havia evidências dos efeitos desoladores do fanatismo. Alguns pareciam crer que a religião consistia em grande exaltação e rumor. Costumavam falar de modo que irritava os incrédulos, e isso influía para se levantar ódio contra eles mesmos e as doutrinas que ensinavam. Então se regozijavam de que sofressem perseguição. Os incrédulos não podiam ver nenhuma coerência nesse procedimento. Nalguns lugares os crentes eram impedidos de celebrar seus cultos. Os inocentes sofriam com os culpados.
Grande parte do tempo eu tinha o coração triste e pesaroso. Parecia coisa cruel que a causa de Cristo devesse ser prejudicada pelo procedimento daqueles homens sem critério. Não somente estavam promovendo a ruína da própria alma, mas pondo sobre a causa um estigma difícil de ser removido. E Satanás, gostava que assim fosse. Convinha-lhe muito ver a verdade manejada por homens não santificados, vê-la misturada com erros, e então tudo juntamente pisado em terra. Olhava com triunfo ao estado de confusão e dispersão dos filhos de Deus.
Estremecíamos ao pensar nas igrejas que iriam ser submetidas a esse espírito de fanatismo. Meu coração condoía-se pelo povo de Deus. Deveriam eles ser enganados e transviados por esse falso entusiasmo? Fielmente proferia os avisos a mim dados pelo Senhor; mas pareciam produzir pouco efeito, exceto no tocante a tornar os extremistas invejosos de mim.
Falsa Humildade
Alguns havia que professavam grande humildade, e advogavam o arrastar-se no chão, quais crianças, como prova de humildade.
Pretendiam que as palavras de Jesus em Mateus 18:1-6 devessem ter cumprimento literal neste período, em que esperavam a volta de seu Salvador. Costumavam arrastar-se em redor de suas casas, nas ruas, nas pontes e na própria igreja.
Eu lhes disse claramente que isso não era exigido; que a humildade que Deus esperava de Seu povo devia manifestar-se por uma vida semelhante à de Cristo, e não pelo arrastar-se no chão. Todas as coisas espirituais devem ser tratadas com santa dignidade. A humildade e mansidão estão de acordo com a vida de Cristo, mas devem mostrar-se de modo digno.
O cristão revela a verdadeira humildade, mostrando a brandura de Cristo, estando sempre pronto para auxiliar a outros, falando palavras amáveis e praticando atos desinteressados, o que eleva e enobrece a mais sagrada mensagem já vinda ao nosso mundo.
A Doutrina do Ócio
Havia alguns em Paris, Maine, que criam ser pecado trabalhar. O Senhor me entregou uma reprovação para o dirigente desse erro, na qual declarava que, abstendo-se do trabalho, propagando seus erros e condenando quem os não recebia, ele estava procedendo contrariamente à Palavra de Deus. Ele rejeitou todas as provas que o Senhor deu para convencê-lo de seu erro, e decidiu-se a não modificar sua maneira de proceder. Empreendeu cansativas viagens, caminhando grandes distâncias para lugares onde apenas receberia desacato, e pensava que assim sofria pela causa de Cristo. Prescindindo de razão e de juízo, obedecia a seus impulsos.
Vi que Deus trabalharia pela salvação de Seu povo: que esse homem desencaminhado logo se manifestaria de modo que todos os honestos de coração veriam que não estava sendo influenciado pelo bom espírito, e que sua carreira breve terminaria. Logo depois se desfez o ardil, e pouca influência ele exerceu sobre os crentes. Atribuiu ao diabo a procedência de minhas visões, e continuou a seguir suas inclinações, até que perdeu o juízo e seus amigos foram obrigados a interná-lo num manicômio. Finalmente fez uma corda com roupa de cama, enforcando-se com ela, e seus seguidores foram levados a se compenetrar da falácia de seus ensinos.
A Dignidade do Trabalho
Deus ordenou que os seres por Ele criados, trabalhem. Disto depende sua felicidade. Ninguém no grande domínio da criação do Senhor, foi feito para ser zangão. Nossa felicidade aumenta e nossa capacidade desenvolve-se ao nos empenharmos em ocupações úteis.
A ação dá poder. Perfeita harmonia prevalece no Universo de Deus. Todos os seres celestiais estão em constante atividade; e o Senhor Jesus, no trabalho de Sua vida, nos deu a todos um exemplo. Ele andou "fazendo o bem". Atos 10:38. Deus estabeleceu a lei da ação obediente. Silenciosos mas incessantes, os objetos de Sua criação fazem o seu trabalho designado. O oceano está em constante movimento. A relva que cresce, "que hoje existe e amanhã é lançada no forno" (Mat. 6:30), desempenha o seu papel, vestindo o campo de beleza. As folhas movem-se, e, no entanto, não se vê mão alguma tocá-las. O Sol, a Lua e as estrelas são úteis e cumprem magnificamente sua missão.
A todo tempo funciona o mecanismo do corpo. Dia após dia o coração pulsa, efetuando a sua tarefa regular e determinada, forçando a corrente carmesim a ir a todas as partes do corpo. Atividade, atividade é o que se vê permear todo mecanismo vivo. E o homem, com seu corpo e mente criados à semelhança de Deus, deve ser ativo a fim de preencher o lugar que lhe foi designado. Não deve estar ocioso. A ociosidade é pecado.
Uma Provação Severa
Em plena experiência de minha luta contra o fanatismo, fui submetida a uma severa provação. Se o Espírito de Deus repousava sobre alguém na reunião, e esse glorificava a Deus, louvando-O, alguns levantavam o brado de mesmerismo; se o Senhor era servido dar-lhe uma visão na reunião, alguns diziam que era efeito da agitação e do mesmerismo.
Aflita e desanimada, eu ia muitas vezes sozinha a um lugar solitário para derramar a alma diante dAquele que convida os cansados e oprimidos para irem a Ele e encontrarem descanso. Enquanto minha fé requeria as promessas, Jesus parecia muito próximo. A suave luz do Céu brilhava em meu redor; parecia-me estar enlaçada pelos braços de meu Salvador e, ali, era arrebatada em visão. Mas quando relatava o que Deus me revelara, a mim sozinha, onde nenhuma influência terrestre poderia afetar-me, ficava aflita e espantada ao ouvir alguns insinuarem que os que viviam mais perto de Deus estavam mais no caso de ser enganados por Satanás.
Alguns quiseram fazer-me crer que não havia Espírito Santo, e que todas as operações que os santos homens de Deus haviam experimentado, eram apenas o efeito do mesmerismo ou da operação de Satanás.
Aqueles que por certos textos das Escrituras haviam adotado opiniões extremistas, abstendo-se completamente do trabalho, e repelindo todos quantos não queriam aceitar suas idéias sobre este ou outros pontos concernentes a deveres religiosos, acusavam-me de me conformar com o mundo. De outro lado, os adventistas nominais acusavam-me de fanatismo, e eu era falsamente apresentada como a dirigente do fanatismo, para cuja repressão eu trabalhava constantemente.
Diferentes ocasiões foram marcadas para a vinda do Senhor, e insistia-se a tal respeito com os irmãos. O Senhor, porém, mostrou-me que passariam, pois o tempo de angústia deveria ocorrer antes da vinda de Cristo; e que cada vez que se marcasse uma data, e esta passasse, isso enfraqueceria a fé do povo de Deus. Por esse motivo eu era acusada de ser o mau servo que dizia: "O meu Senhor tarde virá." Mat. 24:48.
Todas essas coisas me afligiam grandemente e, em minha confusão, era algumas vezes tentada a duvidar de minha própria experiência.
Enquanto numa manhã orávamos em família, o poder de Deus desceu sobre mim e, subitamente, ocorreu-me o pensamento de que era mesmerismo, e resisti. Imediatamente fui atacada de mudez, e por alguns momentos perdi de vista tudo quanto me cercava. Vi então meu pecado por duvidar do poder de Deus, e que, devido a isso, ficara muda, mas minha língua seria desatada em menos de vinte e quatro horas.
Os Cinqüenta Textos:
Luc. 1:20   Filip. 2:13-15   Mar. 16:17 e 18
João 16:15   Efés. 6:10-13   João 9:20-27
Atos 2:4   Efés. 6:14-18   João 14:13-15
Atos 4:29 e 30   Efés. 4:32   João 15:7 e 8
Atos 4:31 I   Ped. 1:22   Mar. 1:23-25
Mat. 7:6   João 13:34 e 35   Rom. 8:38 e 39
Mat. 7:7-12   II Cor. 13:5   Apoc. 3:7-13
Mat. 7:15   I Cor. 3:10 e 11   Apoc. 14:4 e 5
Mat. 24:24   I Cor. 3:12 e 13   Filip. 3:20
Col. 2:6 e 7   Atos 20:28-30    Tia. 5:7 e 8
Heb. 10:35-37   Gál. 1:6-9   Filip. 3:21
Col. 2:8   Luc. 12:3-7   Apoc. 14:14-17
Heb. 10:38 e 39   Luc. 4:10 e 11   Heb. 4:9
Heb. 4:10 e 11   II Cor. 4:6-9   Apoc. 21:2
Heb. 4:12   II Cor. 4:17 e 18   Apoc. 14:1
Filip. 1:6   I Ped. 1:5-7   Apoc. 22:1-5
Filip. 1:27-29   I Tess. 3:8

Foi-me mostrado um cartão, em que estavam escritos em letras de ouro o capítulo e versículos de cinqüenta textos das Escrituras.
Depois que voltei da visão, pedi por sinais a lousa, e nela escrevi que estava muda, também o que vira, e que queria a Bíblia grande. Tomei-a, e prontamente busquei todos os textos que vira no cartão.
Estive sem poder falar durante o dia todo. Cedo na manhã seguinte, minha alma se encheu de alegria, minha língua se soltou e prorrompi em grandes louvores a Deus. Depois daquilo não ousei duvidar, nem por um momento sequer resistir ao poder de Deus, pensassem outros de mim o que quisessem.
Até então não me fora possível escrever; minha mão trêmula não podia segurar com firmeza a pena. Estando em visão, um anjo me ordenou escrevê-la. Obedeci, e escrevi prontamente. Meus nervos estavam fortalecidos, e desde aquele dia até hoje minha mão tem estado firme.
Exortações à Fidelidade
Era muito penoso para mim, relatar aos que erravam o que, concernente a eles, me havia sido mostrado. Causava-me grande angústia ver outros perturbados ou entristecidos. E, sendo obrigada a declarar as mensagens, queria muitas vezes abrandá-las e fazê-las parecer tão favoráveis às pessoas quanto eu podia, e então ficava a sós e chorava em agonia de espírito. Eu olhava àqueles que pareciam ter apenas sua própria alma para cuidar, e achava que, se estivesse em sua situação, não murmuraria. Era penoso descrever os testemunhos claros e incisivos a mim apresentados por Deus. Ansiosamente aguardava o resultado; e, se as pessoas reprovadas se rebelavam contra a reprovação, e mais tarde se opunham à verdade, eu me perguntava: Terei eu apresentado a mensagem exatamente como devia? Não poderia haver algum meio de os salvar? E então me oprimia a alma uma angústia tal que muitas vezes achava que a morte seria um bem-vindo mensageiro e a sepultura um suave lugar de descanso.
Não compreendia que assim inquirindo e duvidando eu era infiel, e não enxergava o perigo e o pecado de tal procedimento, até que, em visão fui levada à presença de Jesus. Ele me olhou com o semblante carregado, e desviou o rosto de mim. Não é possível descrever o terror e a agonia que então senti. Prostrei-me sobre o rosto diante dEle, mas não tinha ânimo para proferir uma palavra. Oh, quanto eu desejava ocultar-me e subtrair-me àquela terrível expressão sombria! Pude compreender então até certo ponto quais serão os sentimentos dos perdidos, quando clamarem às montanhas e às rochas: "Caí sobre nós, e escondei-nos da face dAquele que está assentado no trono, e da ira do Cordeiro." Apoc. 6:16.
Imediatamente um anjo me mandou levantar, e o quadro que meus olhos viram dificilmente poderá ser descrito. Diante de mim havia uma multidão de cabelos desgrenhados e vestes despedaçadas, e cujo rosto era a própria expressão do desespero e terror. Achegaram-se a mim, e roçaram suas vestes nas minhas. Quando olhei às minhas vestes, vi que estavam manchadas de sangue. De novo caí como morta aos pés do meu anjo assistente. Não podia alegar uma desculpa, e desejava estar fora daquele santo lugar.
O anjo me pôs de pé, e disse: "Este não é o teu estado agora; mas esta cena te foi apresentada para te fazer saber qual será tua situação se negligenciares declarar a outros o que o Senhor te revelou. Mas se fores fiel até o fim, comerás da árvore da vida, e beberás da água da vida. Terás de sofrer muito, mas a graça de Deus te basta."
Então senti-me disposta a fazer tudo que o Senhor exigisse de mim a fim de obter Sua aprovação, e não contemplar Sua terrível expressão de desagrado.
O Selo da Aprovação Divina
Aqueles foram tempos agitados. Se não tivéssemos então permanecido firmes, teríamos naufragado na fé. Alguns diziam que éramos obstinados; tínhamos de pôr nosso rosto como um seixo, e não desviar-nos nem para a direita nem para a esquerda.
Durante anos trabalhávamos para rebater os preconceitos e subjugar a oposição que por vezes ameaçava sobrepujar os fiéis porta-bandeiras da verdade - heróis e heroínas da fé. Achávamos, porém, que aqueles que buscavam a Deus em humildade e contrição de alma eram capazes de discernir entre o verdadeiro e o falso. "Guiará os mansos retamente; e aos mansos ensinará o Seu caminho." Sal. 25:9.
Deus nos concedeu uma experiência preciosa naqueles dias. Quando em conflito cerrado com os poderes das trevas, como freqüentemente nos achávamos, tudo apresentávamos ao poderoso Auxiliador. Repetidas vezes orávamos pedindo força e sabedoria. Não nos queríamos render, pois sentíamos que o auxílio deveria vir. E pela fé em Deus, o ataque inimigo virou-se contra ele mesmo, ganharam-se vitórias gloriosas para a causa da verdade, e viemos a compreender que Deus não nos dera Seu espírito por medida. Não fossem essas provas especiais do amor de Deus, não houvesse Ele, dessa maneira, pela manifestação de Seu Espírito, aposto Seu selo à verdade, e poderíamos ter desanimado. Mas essas provas da direção divina, essas vívidas experiências nas coisas de Deus, fortaleceram-nos para ferirmos corajosamente as batalhas do Senhor. Os crentes puderam mais claramente discernir como Deus lhes havia apontado o caminho, guiando-os por entre provações, desapontamentos e terríveis conflitos. Tornavam-se mais fortes à medida que encontravam e venciam obstáculos, e adquiriam uma rica experiência a cada passo que avançavam.
Lições do Passado
Em anos seguintes, foi-me mostrado que as falsas teorias insinuadas no passado, de maneira alguma surgiram em vão. Em havendo oportunidades favoráveis, elas reaparecerão. Não nos esqueçamos de que tudo que puder ser abalado, sê-lo-á. Com algumas pessoas o inimigo será bem-sucedido ao subverter a fé, mas os que forem fiéis aos princípios, não serão abalados. Permanecerão firmes por entre provações e tentações. O Senhor indicou esses erros; e os que não discernirem onde Satanás entra continuarão a ser levados por falsos caminhos. Jesus nos ordena ser vigilantes, e confirmar os restantes, que estão para morrer.
Não devemos entrar em controvérsia com os que mantêm falsas teorias. A discussão não traz proveito. Cristo nunca a entreteve. "Está escrito" (Luc. 4:8) - era a arma usada pelo Redentor do mundo. Conservemo-nos ligados à Palavra. Deixemos que o Senhor Jesus e Seus mensageiros testifiquem. Sabemos que o testemunho deles é verdadeiro.
Cristo preside todas as obras de Sua criação. Na coluna de fogo Ele guiava os filhos de Israel, vendo os Seus olhos o passado, o presente e o futuro. Ele deve ser reconhecido e honrado por todos os que amam a Deus. Seus mandamentos devem ser a força dirigente na vida de Seu povo.
O tentador vem com a insinuação de que Cristo removeu a sede de Seu trono e poder para alguma região desconhecida, e que os homens não mais necessitam de ser incomodados com exaltar-Lhe o caráter e obedecer à Sua lei. Os seres humanos devem ser uma lei para si mesmos, declara ele. Esses enganos exaltam o eu e anulam a Deus. Destroem as restrições e o governo moral na família humana. As restrições ao vício enfraquecem mais e mais. O mundo não ama nem teme a Deus. E os que não amam nem temem a Deus logo perdem todo o senso da obrigação de uns para com os outros. Estão sem Deus e sem esperança no mundo.
Os ensinadores que não põem diariamente a Palavra de Deus em contato com o trabalho de sua vida estão em grande perigo. Não possuem de Deus ou de Cristo um conhecimento tal que possa salvar. Aqueles que não vivem a verdade são os que mais propensos se acham a inventar enganos para ocupar o tempo e absorver a atenção que deveriam ser empregados no estudo da Palavra de Deus. Terrível erro é para nós negligenciarmos o estudo da Bíblia, e estudarmos teorias que desorientam, desviando a mente das palavras de Cristo para as falácias de origem humana.
Não precisamos de nenhum ensino imaginoso no tocante à personalidade de Deus. O que Deus deseja que conheçamos a Seu respeito está revelado em Sua Palavra e em Suas obras. As belas coisas da natureza revelam o Seu caráter e poder criador. São a Sua dádiva à raça humana a fim de mostrar o Seu poder, e mostrar que Ele é um Deus de amor. Mas ninguém está autorizado a dizer que Deus mesmo esteja em pessoa na flor, na folha ou na árvore. Estas coisas são obra de Deus e revelam Seu amor à humanidade.
Cristo é a perfeita revelação de Deus. Aqueles que desejam conhecer a Deus, estudem a obra e os ensinos de Cristo. Àqueles que O recebem e nele crêem, Ele dá o poder de serem feitos filhos de Deus.

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