Este tema é baseado em Mateus 27:31-53; Marcos 14:20-38;
Lucas 23:26-46; João 19:16-30.
E quando chegaram ao lugar chamado a Caveira, ali O
crucificaram”. Lucas 23:33. “Para santificar o povo pelo Seu próprio sangue”,
Cristo “padeceu fora da porta”. Hebreus 13:12. Pela transgressão da lei divina,
Adão e Eva foram banidos do Éden. Cristo, nosso substituto, devia sofrer fora
dos limites de Jerusalém. Ele morreu fora da porta, onde eram executados
malfeitores e homicidas. Plenas de sentido são as palavras: “Cristo nos
resgatou da maldição da lei, fazendo-Se maldição por nós”. Gálatas 3:13.{DTN 524.1}
Uma vasta multidão seguiu a Jesus do tribunal ao Calvário.
As novas de Sua condenação se espalharam por toda Jerusalém, e gente de todas
as classes e de todas as categorias afluíam ao lugar da crucifixão. Os
sacerdotes e principais haviam-se comprometido, caso Jesus lhes fosse entregue,
a não molestar Seus seguidores; e os discípulos da cidade e dos arredores
uniram-se à multidão que acompanhava o Salvador.{DTN 524.2}
Ao passar Jesus a porta do pátio de Pilatos, a cruz
preparada para Barrabás foi-lhe deposta nos feridos, sangrentos ombros. Dois
companheiros de Barrabás deviam sofrer a morte ao mesmo tempo que Jesus, e
sobre eles também foi posta a cruz. A carga do Salvador era demasiado pesada
para o estado de fraqueza e sofrimento em que Se achava. Desde a ceia pascoal
com os discípulos, não tomara Ele nenhum alimento, nem bebera. Angustiara-Se no
jardim do Getsémani em conflito com as forças satânicas. Suportara a agonia da
traição, e vira os discípulos abandonarem-nO e fugir. Fora levado a Anás, depois
a Caifás e em seguida a Pilatos. De Pilatos fora mandado para Herodes, e
reenviado a Pilatos. De um insulto para outro, de uma a outra zombaria, duas
vezes torturado por açoites — toda aquela noite fora uma sucessão de cenas de
molde a provar até ao máximo uma alma de homem. Cristo não fracassara. Não
proferira palavra alguma que não visasse a glória de Deus. Através de toda a
ignominiosa farsa de julgamento, portara-Se com firmeza e dignidade. Mas quando
após ser açoitado pela segunda vez, a cruz Lhe foi posta sobre os ombros, a
natureza humana não mais podia suportar. Caiu desmaiado sob o fardo. {DTN
524.3}
A multidão que seguia o Salvador viu Seus fracos, vacilantes
passos, mas não manifestou compaixão. Insultaram-nO e injuriaram-nO por não
poder conduzir a pesada cruz. De novo Lhe foi posto em cima o fardo, e outra
vez caiu desmaiado por terra. Viram os perseguidores que Lhe era impossível
levar mais adiante aquele peso. Não sabiam onde encontrar alguém que quisesse
transportar a humilhante carga. Os próprios judeus não o podiam fazer, pois a
contaminação os impediria de observar a páscoa. Ninguém, mesmo dentre a turba
que O acompanhava, quereria rebaixar-se e carregar a cruz. {DTN 524.4}
Por essa ocasião um estranho, Simão, cireneu, chegando do
campo, encontra-se com o cortejo. Ouve as zombarias e a linguagem baixa da
turba; ouve as palavras desdenhosamente repetidas: Abri caminho para o Rei dos
judeus! Detém-se espantado com a cena; e, ao exprimir ele compaixão, agarram-no
e lhe põem nos ombros a cruz.{DTN 525.1}
Simão ouvira falar de Jesus. Seus filhos criam no Salvador,
mas ele próprio não era discípulo. O conduzir a cruz ao Calvário foi-lhe uma
bênção e, posteriormente, mostrou-se sempre grato por essa providência. Isso o
levou a tomar sobre si a cruz de Cristo por sua própria escolha, suportando-lhe
sempre animosamente o peso.{DTN 525.2}
Não poucas mulheres se acham na multidão que segue à Sua
morte cruel Aquele que não foi condenado. Sua atenção fixa-se em Jesus. Algumas
O tinham visto antes. Outras Lhe levaram doentes e sofredores. Outras ainda
foram, elas mesmas, curadas por Ele. Relata-se então a história das cenas que
ocorreram. Elas se admiram do ódio da turba para com Aquele por quem o coração
se lhes comove quase a ponto de partir-se. E não obstante a ação da enfurecida
massa, e as coléricas palavras dos sacerdotes e principais, essas mulheres
exprimem o compassivo interesse que as possui. Ao cair Jesus desfalecido sob a
cruz, irrompem em lamentoso pranto.{DTN 525.3}
Foi isso unicamente que atraiu a atenção de Cristo. Embora
em meio de tanto sofrimento, enquanto suportava os pecados do mundo, não era
indiferente à expressão de dor. Com terna simpatia contemplou essas mulheres.
Não eram crentes nEle; sabia que não O estavam lamentando como um enviado de
Deus, mas movidas por sentimentos de piedade humana. Não lhes desprezava a
simpatia, mas esta Lhe despertou no coração outra, mais profunda ainda, para
com elas mesmas. “Filhas de Jerusalém”, disse Ele, “não choreis por Mim, mas
chorai antes por vós mesmas, e por vossos filhos”. Lucas 23:28. Do espetáculo
que tinha diante de Si, alongou Jesus o olhar ao tempo da destruição de
Jerusalém. Naquela terrível cena, muitas das que estavam chorando agora por
Ele, haveriam de perecer com seus filhos.{DTN 525.4}
Da queda de Jerusalém passaram os pensamentos de Jesus a um
mais amplo juízo. Na destruição da impenitente cidade viu Ele um símbolo da
final destruição a sobrevir ao mundo. Disse: “Então começarão a dizer aos
montes: Caí sobre nós, e aos outeiros: Cobri-nos. Porque, se ao madeiro verde
fazem isto, que se fará ao seco?” Lucas 23:30, 31. Pelo madeiro verde, Jesus Se
representava, o inocente Redentor. Deus permitiu que Sua ira contra a
transgressão caísse sobre Seu amado Filho. Devia ser crucificado pelos pecados
dos homens. Que sofrimento, então, havia de suportar o pecador que continuasse
na transgressão? Todos os impenitentes e incrédulos teriam de conhecer uma dor
e miséria que a língua é impotente para exprimir. {DTN 525.5}
Da multidão que acompanhava o Salvador ao Calvário, muitos O
haviam seguido com jubilosas hosanas e agitando palmas, enquanto marchava
triunfalmente para Jerusalém. Mas não poucos dos que então Lhe entoaram
louvores porque era popular assim fazer, avolumavam agora o clamor: “Crucifica-O,
crucifica-O”! Lucas 23:21. Quando Jesus cavalgava o jumento em direção de
Jerusalém, as esperanças dos discípulos subiram ao mais alto grau.
Tinham-se-Lhe aglomerado em torno, sentindo ser elevada honra estar ligados a
Ele. Agora, em Sua humilhação, seguiam-nO à distância. Estavam possuídos de
pesar e curvados ante o malogro de suas esperanças. Como se verificavam as
palavras de Cristo: “Todos vós esta noite vos escandalizareis em Mim; porque
está escrito: Ferirei o Pastor, e as ovelhas do rebanho se dispersarão”. Mateus
26:31.{DTN 526.1}
Chegando ao lugar da execução, os presos foram ligados ao
instrumento da tortura. Os dois ladrões lutaram às mãos dos que os puseram na
cruz; Jesus, porém, nenhuma resistência opôs. A mãe de Jesus, apoiada por João,
o discípulo amado, seguira seu Filho ao Calvário. Vira-O desmaiar sob o peso do
madeiro, e anelara suster com a mão aquela cabeça ferida, banhar aquela fronte
que um dia se lhe reclinara no seio. Não lhe era, no entanto, concedido esse
triste privilégio. Ela, como os discípulos, acalentava ainda a esperança de que
Jesus manifestasse Seu poder e Se livrasse dos inimigos. Mais uma vez seu
coração desfaleceria, ao evocar as palavras em que lhe haviam sido preditas as
próprias cenas que se estavam desenrolando então. Enquanto os ladrões eram
amarrados à cruz, ela observava em angustiosa suspensão. Haveria de Aquele que
dera vida aos mortos, sofrer o ser Ele próprio crucificado? Suportaria o Filho
de Deus o ser tão cruelmente morto? Deveria ela renunciar a sua fé de que Jesus
era o Messias? Deveria testemunhar-Lhe a vergonha e a dor, sem ter sequer o
consolo de servi-Lo em Sua aflição? Viu-Lhe as mãos estendidas sobre a cruz;
foram trazidos o martelo e os pregos, e, ao serem estes cravados na tenra
carne, os discípulos, fundamente comovidos, levaram da cruel cena o corpo
desfalecido da mãe de Jesus.{DTN 526.2}
O Salvador não murmurou uma queixa. O rosto permaneceu-Lhe
calmo e sereno, mas grandes gotas de suor borbulhavam-Lhe na fronte. Nenhuma
mão piedosa a enxugar-Lhe do rosto o suor da morte, nem palavras de simpatia e
inabalável fidelidade para Lhe confortar o coração humano. Enquanto os soldados
executavam a terrível obra, Jesus orava pelos inimigos: “Pai, perdoa-lhes,
porque não sabem o que fazem”. Lucas 23:34. Seu pensamento passou da dor
própria ao pecado dos que O perseguiam, e à terrível retribuição que lhes
caberia. Nenhuma maldição invocou sobre os soldados que O estavam tratando tão
rudemente. Nenhuma vingança pediu contra os sacerdotes e príncipes que contemplavam
com maligna satisfação o cumprimento de seu desígnio. Cristo Se apiedou deles
em sua ignorância e culpa. Só exalou uma súplica por seu perdão — “porque não
sabem o que fazem”. {DTN 526.3}
Soubessem eles que estavam torturando Aquele que viera salvar
da eterna ruína a raça pecadora, e ter-se-iam possuído de remorso e horror. Sua
ignorância, porém, não lhes tirava a culpa; pois era seu privilégio conhecer e
aceitar a Jesus como seu Salvador. Alguns deles veriam ainda o seu pecado, e
arrepender-se-iam e se converteriam. Alguns, por sua impenitência, tornariam, a
seu respeito, uma impossibilidade o