29.6.09

O CHAMADO DE DEUS A ABRAÃO - 2

UM ALTAR
Por onde Abraão andava, edificava um altar ao Senhor. É preciso recordar que a promessa de que todas as nações haveriam de ser abençoadas em Abraão, especificava a inclusão das famílias. A religião de Abraão era uma religião da família. Nunca se descuidou do altar familiar. Não se trata de uma linguagem figurada, mas sim a prática real dos pais a quem foi feita a promessa; promessa, promessa que compartilhamos se temos a fé e prática que eles tiveram.
UM EXEMPLO PARA OS PAIS
Deus disse a Abraão: “Porque eu o escolhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do SENHOR e pratiquem a justiça e o juízo; para que o SENHOR faça vir sobre Abraão o que tem falado a seu respeito”. (Génesis 18:19).
Observe as palavras: “ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do SENHOR e pratiquem a justiça e o juízo”. Não ordenaria simplesmente que o fizessem assim, deixando logo o assunto esquecido, senão que, depois de haver dado mandamento, o resultado seria que guardariam o caminho do Senhor. Isto é, seu ensinamento se tornaria eficaz.
Podemos estar seguros que os mandamentos que Abraão deu a seus filhos e a sua família não eram rigorosos nem arbitrários. Os compreendemos melhor ao considerar a natureza dos mandamentos de Deus. “Seus mandamentos não são pesados” (I João 5:3). “Seu mandamento é a vida eterna” (João 12:50). Quem deseja seguir o exemplo de Abraão dirigindo a sua família por meio de regras duras e arbitrárias, e actuando como um juiz severo ou como um tirano, ameaçando o que irá acontecer se suas ordens não são obedecidas e executadas suas decisões, não segundo o espírito de Amor – por que são correctas –, mas sim por ser mais forte que seus filhos e porque estão debaixo do seu poder, tem muito que aprender do Deus de Abraão. “E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Efésios 6:4).
Ao mesmo tempo podemos estar seguros de que seus mandamentos não eram como os de Eli, débeis e queixosas repreensões a seus ímpios e miseráveis filhos: E disse-lhes: “Por que fazeis tais coisas? Pois de todo este povo ouço constantemente falar do vosso mau procedimento. Não, filhos meus, porque não é boa fama esta que ouço” (I Samuel 2:23 e 24). Foi pronunciado juízo contra ele e sua casa, “Porque já lhe disse que julgarei a sua casa para sempre, pela iniquidade que ele bem conhecia, porque seus filhos se fizeram execráveis, e ele os não repreendeu” (I Samuel 3:13). Em contraste, Abraão transmitiu a bênção por toda a eternidade, devido a que os mandamentos que deu a seus filhos tiveram poder para impedir o mal.
Abraão haveria de ser uma bênção para todas as famílias. Por onde ele andava, era uma bênção. Porém esta bênção começou em sua família. Ali esteve o centro. A influencia do céu chegou a seus vizinhos a partir do círculo da família. E agora bem podemos prestar atenção particular a afirmação de que quando Abraão edificou um altar, “e invocou o nome do SENHOR” (Génesis 12:8, 13:4). Young traduz assim: “Pregou em nome de Jeová”. Se prestar atenção aos vários lugares onde aparece a mesma expressão, notará que a terminologia em hebraico é idêntica a de Êxodo 35:5, onde lemos que o Senhor desceu na nuvem, permaneceu ao lado de Moisés, “proclamou o nome de Jeová”. Portanto, podemos compreender que quando Abraão edificou o altar da família, não estava simplesmente instruindo a sua família imediata, mas que “proclamou o nome de Jeová” a todo o mundo a seu redor. Do mesmo modo que Noé, Abraão foi um pregoeiro de justiça (II Pedro 2:5). Deus pregou o evangelho a Abraão, e este o pregou a outros.
ABRAÃO E LÓ
“Era Abrão muito rico; possuía gado, prata e ouro”. “Ló, que ia com Abrão, também tinha rebanhos, gado e tendas. E a terra não podia sustentá-los, para que habitassem juntos, porque eram muitos os seus bens; de sorte que não podiam habitar um na companhia do outro. Houve contenda entre os pastores do gado de Abrão e os pastores do gado de Ló. Nesse tempo os cananeus e os ferezeus habitavam essa terra. Disse Abrão a Ló: Não haja contenda entre mim e ti e entre os meus pastores e os teus pastores, porque somos parentes chegados”. (Génesis 13:2, 5-8).
Quando compreendemos a natureza da promessa de Deus a Abraão podemos compreender o segredo de sua generosidade. Ló escolheu a melhor parte do país; isso não fez nenhuma diferença com respeito a herança de Abraão: Tendo a Cristo, tinha todas as coisas. A sua preocupação não estava centrada nas suas possessões na vida presente, mas na vida porvir. Aceitava com gratidão a prosperidade que o Senhor lhe quisesse enviar; porém se as suas riquezas nesta vida fossem extintas, isso em nada diminuiria a herança que lhe foi prometida.
Não há nada como a presença e bênção de Cristo para pôr fim a toda disputa, ou para evitá-la. Na acção de Abraão encontramos um verdadeiro exemplo cristão. Como o de mais idade, poderia ter invocado a sua dignidade e exigido os seus “direitos”. Entretanto, não poderia fazer assim pelo facto de ser um cristão. O Amor “não busca o que é seu”. Abraão manifestou o verdadeiro espírito de Cristo. Quando os professos cristãos são sedentos em reclamar as coisas deste mundo, e temem diante da expectativa de serem privados de alguns de seus direitos, demonstram indiferença para com a herança eterna que Cristo oferece.
A PROMESSA REPETIDA
A cortesia cristã de Abraão, que era o resultado da sua fé na promessa mediante Cristo, não passou desapercebida diante do Senhor. Lemos:
“Disse o SENHOR a Abrão, depois que Ló se separou dele: Ergue os olhos e olha desde onde estás para o norte, para o sul, para o oriente e para o ocidente; porque toda essa terra que vês, eu ta darei, a ti e à tua descendência, para sempre. Farei a tua descendência como o pó da terra; de maneira que, se alguém puder contar o pó da terra, então se contará também a tua descendência. Levanta-te, percorre essa terra no seu comprimento e na sua largura; porque eu ta darei” (Génesis 13:14-17).
Não esqueçamos que “Ora, as promessas foram feitas a Abraão e ao seu descendente. Não diz: E aos descendentes, como se falando de muitos, porém como de um só: E ao teu descendente, que é Cristo”. (Gálatas 3:16). Não existe outra descendência de Abraão fora de Cristo e os que são d´Ele. Portanto, essa incontável prosperidade que prometeu a Abraão é idêntica à referida nesta outra passagem da Escritura:
“Depois destas coisas, vi, e eis grande multidão que ninguém podia enumerar, de todas as nações, tribos, povos e línguas, em pé diante do trono e diante do Cordeiro, vestidos de vestiduras brancas, com palmas nas mãos; e clamavam em grande voz, dizendo: Ao nosso Deus, que se assenta no trono, e ao Cordeiro, pertence a salvação”. “Um dos anciãos tomou a palavra, dizendo: Estes, que se vestem de vestiduras brancas, quem são e donde vieram? Respondi-lhe: meu Senhor, tu o sabes. Ele, então, me disse: São estes os que vêm da grande tribulação, lavaram suas vestiduras e as alvejaram no sangue do Cordeiro” (Apocalipse 7:9 e 10, 13 e 14).
Já temos visto que a bênção de Abraão vem a todas as nações por meio da cruz de Cristo, de forma que na declaração de que esta imensa multidão lavou suas vestes e as alvejou no sangue do Cordeiro, vemos o cumprimento da promessa feita a Abraão com o propósito de uma descendência impossível de ser contada. “E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa”. (Gálatas 3:29).
É preciso observar que a repetição da promessa, no capítulo 13 de Génesis, a terra tem um lugar muito importante. O vimos em nosso estudo anterior, e voltaremos a encontrá-lo como característica fundamental da promessa, ali onde esta apareça.
ABRAÃO E MELQUISEDEQUE
A breve história de Melquisedeque é a cadeia que une nosso tempo com o de Abraão e os seus, e que mostra que a assim chamada “dispensação cristã”, existia nos dias de Abraão tanto como agora. O capítulo 14 de Génesis diz-nos tudo o que sabemos sobre Melquisedeque. O capítulo 7 de Hebreus repete a história, e faz alguns comentários sobre ela. Há também referências a Melquisedeque no capítulo 6, no Salmo 110:4.
Esta é a história: Abraão regressava de uma expedição contra os inimigos que tinham tomado Ló como prisioneiro, quando Melquisedeque lhe saiu ao encontro, trazendo pão e vinho. Melquisedeque era rei de Salém, e sacerdote do Deus Altíssimo. Nesta qualidade abençoou Abraão, e este lhe deu o dízimo do despojo recuperado. Esta é a história, porém a partir dela aprendemos lições de grande importância.
Em primeiro lugar vemos que Melquisedeque tinha uma posição superior a Abraão já que “Evidentemente, é fora de qualquer dúvida que o inferior é abençoado pelo superior”, e também porque Abraão lhe deu o dízimo.
Era um tipo de Cristo; era “a semelhança do filho de Deus” (Hebreus 7:3). Era uma figura de Cristo por ser ao mesmo tempo rei e sacerdote. O seu nome significa “Rei de justiça”, e Salém, da qual era rei, significa “paz”; por tanto, não era apenas sacerdote, mas rei de justiça e rei de paz. De Cristo está escrito: “Disse o SENHOR ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés. O SENHOR jurou e não se arrependerá: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque”. (Salmo 110:1, 4). E o nome com o qual ele será chamado é “Senhor justiça nossa” (Jeremias 23:6).
As Escrituras referem-se nestas palavras sobre a realeza do sacerdócio de Cristo: “E dize-lhe: Assim diz o SENHOR dos Exércitos: Eis aqui o homem cujo nome é Renovo; ele brotará do seu lugar e edificará o templo do SENHOR. Ele mesmo edificará o templo do SENHOR e será revestido de glória; assentar-se-á no seu trono, e dominará, e será sacerdote no seu trono; e reinará perfeita união entre ambos os ofícios” (Zacarias 6:12 e 13). O poder que por ele Cristo, como sacerdote, faz reconciliação pelos pecados do povo, é o poder do trono de Deus sobre o qual se senta.
Porém o ponto principal, em referência a Melquisedeque, é que Abraão viveu na mesma “dispensação” que nós vivemos. O sacerdócio era então da mesma ordem que agora. Não é somente que sejamos os filhos de Abraão, se somos da fé; além disso, o nosso Sumo Sacerdote - que subiu aos céus -, foi feito pelo juramento de Deus Sumo Sacerdote para sempre “segundo a ordem de Melquisedeque”. Assim em um duplo sentido, está claro que “Se sois de Cristo, certamente sois descendentes de Abraão, e herdeiros segundo a promessa”. “Abraão, vosso pai, alegrou-se por ver o meu dia, viu-o e regozijou-se” (João 8:56).
Abraão, portanto, era cristão como os que viveram após a crucifixão de Cristo. “Em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos” (Actos 11:26). Porém, os discípulos não eram diferentes depois de os chamarem cristãos, do que foram antes disso. Quando eram conhecidos simplesmente como judeus, eram tão cristãos quanto depois de serem chamados dessa maneira. O nome não significa muito. Foram chamados de cristãos por serem seguidores de Cristo; no entanto, seguiam a Cristo antes que lhe chamassem cristãos, tanto quanto o seguiram depois. Abraão, centenas de anos antes dos dias de Jesus de Nazaré, foi precisamente o que seria cada discípulo em Antioquia a quem chamaram-no cristão: um seguidor de Cristo. Por tanto, em sentido mais pleno da palavra, foi um cristão. Todos os cristãos, e ninguém mais que eles, são os filhos de Abraão.
Observe que o sétimo capítulo de Hebreus nos mostra o caso de Abraão e Melquisedeque como prova de que ele pagou dos dízimos não é uma ordenança levítica. Muito antes do nascimento de Levi, Abraão pagou os dízimos. E os pagou a Melquisedeque cujo sacerdócio era um sacerdócio cristão. Por tanto, os que estão em Cristo, e por tanto são filhos de Abraão, darão também o dízimo de tudo.
Devemos notar que o dízimo era algo bem conhecido nos dias de Abraão. Este deu os dízimos ao sacerdote de Deus como algo natural. Reconheceu o fato de que a décima parte é do Senhor. O registo de Levítico não é a origem do sistema do dízimo, mas uma simples constatação do fato. Até a própria ordem levítica pagou os dízimos em Abraão (Hebreus 7:9). Não se diz acerca de quando foi dada essa instituição ao homem pela primeira vez, porém vemos que era bem conhecida nos dias de Abraão. No livro de Malaquias, que está especialmente dirigido àqueles que vivem justamente “antes que venha o grande e terrível dia do Senhor” (Malaquias 4:5), nos diz que aqueles que retém os dízimos estão roubando ao Senhor.
O argumento é simples: Abraão deu o dízimo a Melquisedeque; o sacerdócio de Melquisedeque é o sacerdócio pelo qual vem a justiça e a paz, o sacerdócio que por ele somos salvos. Abraão deu o dízimo a Melquisedeque por que Melquisedeque era o representante do Deus Altíssimo, e o dízimo é do Senhor. Se somos de Cristo, somos filhos de Abraão; e se não somos filhos de Abraão, então não somos de Cristo. Entretanto, se somos filhos de Abraão temos de fazer as obras de Abraão. De quem somos?
Existe ainda outro ponto a destacar. Se você é observador lhe chamará a atenção o fato de que Melquisedeque, que foi feito rei de justiça e paz, e sacerdote do Deus Altíssimo, trouxe a Abraão pão e vinho: são os emblemas do corpo e o sangue de nosso Senhor. Pode-se concluir que o pão e o vinho tinham por objectivo o sustento físico de Abraão e seus acompanhantes. No entanto, isso em nada diminui o significado do fato. Melquisedeque saiu em sua qualidade de rei e sacerdote, e Abraão o reconheceu como tal. Observe a relação em Gênesis 14:18 e 19: “Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; era sacerdote do Deus Altíssimo; abençoou ele a Abrão e disse: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra”. É evidente que o pão e o vinho que Melquisedeque ofereceu adquiriu significado especial pelo fato de que era sacerdote do Deus Altíssimo. Os judeus do tempo de Cristo se enganaram a respeito de sua afirmação de que Abraão se alegrou por ver o dia de Cristo. Não podiam ver evidência alguma deste fato. Podemos nós ver nessa transacção uma evidência de que Abraão viu o dia de Cristo, que é o dia da salvação?

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